quinta-feira, 30 de julho de 2015

Geração do Café com Leite

- Garçom, duas xícaras de café com leite, faça o favor!
Aqui nesta mesa, lhe confesso o café que me foi negado em tempos antigos, o leite que me foi derramado e frio, azedou. Quando pequena, junto aos mais velhos, o que me sobrava era a porcaria do café com leite, a mistura do contento.  “- É isso o que tens, contente-se”. Infeliz idade do pega-pega, do esconde-esconde, da criação do chicote (queimado só para mim). Infeliz dias de café com leite, quando todos na sala se embriagavam com o azedume da bebida quente e amarga, do leite entupido de nata. Infeliz idade de quando, para mim, só servia-me a mistura.
Aqui nesta mesa, lhe confesso as dores do crescimento, minha crise adolescente, meus tormentos e a estúpida mistura que nunca me deixou....
- Garçom! Mais uma dose, por favor.
Atormentada pelo contentamento durante toda uma vida. Nada o bastante para um café puro e forte, fraca demais para um leite azedo e frio. Café com leite na vida! No amor: o que me restou, o que sobrou, as migalhas, a frieza, o tormento da não correspondência. PORCARIA DE MISTURA! Única coisa que queria era um café quente, ao lado do meu amor em dias de frio. Porcaria de leite, que derramado, esfriou e me esqueceu.
- Garçom!
Não bastante a bebida aterrorizante que me era oferecida em todos os momentos de minha vida, eu era e sou, quem sabe serei: o próprio café com leite.  Nem doce, nem amarga, nem quente, nem fria, mistura equilibrada composta por extremos. Estúpido café com leite que me afoga e impede de sofrer um pouco mais. Sofrer um pouco mais...
- Garçom? Não, a bebida ainda não acabou... Pode sentar-se um pouco? Quero lhe confessar...
Ingratidão! O café com leite me perdoe, ingrata que fui por toda uma vida. Quis trocar quem sempre me protegeu... Aqui nesta mesa, te digo: o café nunca me escolheu, o leite nunca me agradou. Separados, nada são... Me dão horror, posso ver.
-Garçom? Não vá embora, não agora, preciso contar.
Há pouco tempo eu experimentei a frieza que me congelou, o calor que me queimou... a dor por ter deixado o meu odiado café com leite. Entenda, pelo amor de Deus, não é confuso nem complicado. É um mero café com leite em desagrado, e eu, a menina que hoje cobiça a mistura. A vida é dura, garçom amigo. Cruel. Pobre, mendigo um pouco mais de paz. A vida é dura, garçom! E eu sou estranha, sei... mas que culpa tenho de odiar ser o café com leite, mas querer a mistura para mim?
Para tudo nessa vida poderíamos dar um jeito, metade café e metade leite, escolher entre os dois não dá certo: preciso do amargo para conhecer o doce, do frio para conhecer o quente, da mistura para odiar as separações, a desgraçada geração solitária que nego até a morte.
Não me contento com a solidão, hoje entendo o café com leite e peço perdão...
- Garçom? A mistura acabou...
Sei que já passou do horário, já estou-me indo. Prometa-me somente, que para tudo na vida daremos um jeito, o nosso, mesmo que não seja bem feito. Para tudo, garçom... o nosso jeito.

Ao café que me é oferecido, ao leite, maldito. À mistura que me embriago, nesta mesa, um brinde!
Ao café com leite, minha (in)gratidão!

segunda-feira, 27 de julho de 2015

Ninguém entende

Podia ser
Podia não
Não ser, é que não podia
Depende
Depende do que podia
Na verdade
Tudo podia
Mas não muito
Não exatamente tudo
Ou tudo

Está certo, podia
Mas não era conveniente
Dependendo do "podia"
Não, não podia não

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Ao amor que é teu

Em tuas mãos coloco o teu amor
Guarda com carinho, meu querido
Ele é teu
O meu amor está em mim
Guardo com todo afinco
E rego todos os dias
Ele sou eu

Guarda com carinho, meu querido
Esse amor que é só teu
Guarda bonitinho
Todo engomadinho
Passado a ferro quente
E te dado de presente
Por nosso amor que nasceu

Fique sabendo que o teu amor é teu
Meu amor é meu
E juntos, eles são nossos
Saiba mais, benzinho
Que meu amor lhe tem muito carinho
Que está todo apressadinho
Só esperando uma brecha do seu

Teu amor é teu
Meu amor, sou eu
Sou eu quem te dá o meu
O meu amor de paz

Teu amor é meu
Meu amor, só eu
Só eu é quem pode te dar mais

Teu amor é meu
Meu amor é teu
Teu amor é teu
Meu amor, sou eu
Só eu 
Só eu e você
(e o amor que é nosso)


sábado, 18 de julho de 2015

Atemporal

Do tempo.
Amigos do tempo
Amores do tempo
Coisas do tempo
Em cada tempo... 
São ciclos.
Hora ou outra o tempo volta e acontece de se reencontrar.
Reencontro da vida 
do acaso
do tempo, mas não temporário
Sem domínio
Sem tempo
do tempo.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Previsão do tempo

A luz solar atingiu a janela predial logo cedo. Abrir os olhos após uma longa noite de sonho foi uma tarefa árdua. O sol queimava as bochechas ao tempo que deixava seu recado: mais um dia. Aconcheguei vida no abraço de um céu azul, o travesseiro era incômodo demais. Os jornais espalhavam a notícia: O tempo é firme nessa região de país. Faz sol durante toda a noite, nenhum indício de chuva para a tempestade que se aproxima. 
Estou certa de que os ventos sopram a favor.
Do lado de cá da janela predial os dias se recusam a dormir tão depressa, prolongam seus horários e anunciam as noites insones. Do lado de lá, o sol já nasce poente e ridiculariza da lógica não observada. 
A luz transpassa a cortina embebida do amargor cinzento dos dias em que não se fabricava sol. Os pássaros anunciam algo que não consigo traduzir... Novos tempos, há de ser. A vida espalha sorrisos em nuvens carregadas e, mais uma vez o jornal avisa: O tempo é firme nessa região do país. É certo que precisará aprender a nadar, esteja preparado: não chove água, mas transborda sentimentos. Um nado em falso e poderá se afogar.


segunda-feira, 13 de julho de 2015

Tragicômico, óbvio

Comediante e ande é ante, anti comédia
Síndrome de tragédia  e ante, anteposição
Caminha sobre o ar aquilo que não está sob o chão
Flutua risos e tantas inconstâncias catastróficas
Comédia adiante
Ande, farsante

Contar-lhe-ei o tragicômico:
Desde que homem nasceu, nasceu e enfim cresceu. Cresceu e morre todo dia - seja noite, seja dia - , é preciso dizer que morre e permanece, mal tarda e anoitece, a lua sobe e o sol desce e o homem, permito-me ressaltar: cai em preces.  E desde que o homem cresce e todo o dia falece, muda e avessa, e ri, mas desconcerta. É certo dizer que a vida é uma tragicomédia e o teatro se faz em palco cotidiano: riram gregos, sofreram troianos. Ou é o oposto do que está dito? Ou não o digo? O que está certo, é que desde o homem nasceu vive em desgraça, ri alto em praças, grita loucuras e poemiza-se em amor. Desde que nasceu, todo homem é um pouco Romeu, toda mulher é Julieta e nenhum dos dois sobrevive ao final, porque, desde que nasceu, o homem enfim cresceu e traça sua história: histórias loucas, melancólicas, amor versos de ódio, sangue e bandeira branca, bigodes de Hitler, chicotes em costas de negros, romances em palcos e beijos apaixonados. Mas desde que nasceu, está certo que o homem cresceu e não importa o que faça, se chore ou elabore graça: o homem morre todo dia, seja noite, seja dia, de infarto ou anemia, até mesmo poesia. O que está certo é que morre, não tarda e anoitece. 
Tragicômico, não?

(para meu Amigo Anônimo - desafio da palavra)

domingo, 12 de julho de 2015

Ponto continuativo. Em frente...

Tolice alguma pensar no passado já não tão distante, virou-se do avesso e teve acesso ao ex passageiro. Retornou com afinco, emergiu de sabe Deus onde. Fugiu das sombras escuras e pretéritas, recorreu à luz do presente. Tolice não pensar em confusão. O regresso vem em dose dupla, os sentidos se aguçam e emanar sossego é questão urgente! Dissolve a paz, caleja o amor. É impreciso decifrar. 
Retorna o ex passageiro, zombeteiro, não há de fazer morada. Ainda que teime confundir, já ouve conhecimento de si. O antídoto está mais forte, não mais vulnerável como de princípio. 

[Criou-se muro em frente ao jardim.
Rocha impermeável]

O regresso é fiel à solução - compromisso de honra! Já passa da hora de caminhar, à frente está o futuro e as questões estão resolvidas logo atrás. Autoriza a partida, não há freio. O ex passageiro se desloca aos fundos, longe se vê - turvo - seu "ir embora".

[Adeus, passageiro não querido]

Tudo está acertado, decidido, terminado. Turbulência já passou.
O muro está firme e forte, compreende melhor os eventos e suspira com leveza.
Marchar para frente!

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Eu reviro, tu revira, nós reviramos os olhos e o mundo acaba perdido.

revirou os olhos como gesto de reprovação. Não bastasse todos os desamores que vinham lhe sendo ditos, era obrigada a permanecer calada. Calada ficava. Oras! Desde sempre, aprendeu que só se deve abrir a boca, antes de tudo, para falar algo que seja digno da inteligência que nos é atribuída. Se ouvia algo que não lhe agradava, ficava aos nervos! Precisava falar, precisava retrucar, precisava responder à altura! Mas sempre foi repreendida: Você é nova para entender, fique quieta. Conversa de adultos. Não, não é assim. Não foi isso que lhe ensinei. Pode? Não, não pode! Ouça primeiro...  Pavores!!!!!! Acabou foi abrindo mão de suas falas, percebeu que, mesmo tendo algo inteligente a falar, nem sempre seria ouvida. Achava era um horror isso de só ouvir o que bem quer, isso de só falar o que for conveniente, aquilo de ser sempre os outros e nunca ela mesma. Mania desgraçada de inventar um novo eu, sendo que ela mesma era só ela. Pensava isso e aquilo e queria isso e aquilo, não concordava nada com aquilo e isso, mas não repreendia, compreendia, respeitava. Cada qual com sua opinião. Cada um a seu modo. Todo mundo aqui é grandinho. 
só não podia deixar de opinar sobre os assuntos, se falar era pecado e não falar era sinônimo de concordância: revirava então seus olhinhos. À toda mentirinha ilusória da mídia: revirava os olhinhos. À toda conversinha sem pé nem cabeça: revirava os olhinhos. À cada nova fofoca da vida de Fulana, do tal escândalo de Ciclano, da violência sem limites de Beltrano: revirava os olhinhos. À cada gesto de impaciência, intolerância, hipocrisia: revirava os olhinhos. Está certo que não era nenhum pouco imune à defeitos, os tinha (alguns em demasia), mas os desprezava. E assim tentava melhorar. 
acontece que deixou de opinar. É preciso dizer que o fato de só revirar os olhinhos tornou-a um ser não atuante, não presente. O fato de só revirar os olhinhos, acabou deixando-a sem voz. O fato de só revirar os olhinhos, acabou fazendo com que fosse, somente, mais uma. Mais uma que não faz nada (além de revirar os olhos, é claro). Esqueceu-se da balança, do equilíbrio fundamental, dos aprendizados que "desde sempre, aprendeu que...". Acabou que deixou de revirar seus olhinhos, o mundo tornou-se um pequeno grupo de pessoas e coisas que giravam ao seu contorno e só. Pouco importava se o mendigo lá do outro lado do país fosse morto e violentado por um grupo de jovens, se não sei quem estivesse passando fome, se a saúde estivesse precária, se a educação podia melhorar, se, se, se, se... Tanto "se"! Foi então que seu revirar de olhos deixou de fazer sentido. Se o problema não era seu, não tinha nada a ver. Falava o que fosse conveniente. Se isso era certo, se aquilo não é da minha conta, se eu não posso fazer nada, se... Acomodou-se. É preciso dizer que, sempre que seus amigos a alertavam da sua acomodação, da sua ausência crítica, do seu: "tô nem aí", ela ficava chateada, comunicava que estava cansada, que problema todo mundo tem, que é assim mesmo e depois piora, que a gente tem que se acostumar, calar e consentir, que falar não adiantava mesmo e não tinha mais nada para fazer... então: revirava os olhinhos...

terça-feira, 7 de julho de 2015

Amor, bendito amor...

Bendito seja esse amor que invade, faz do corpo sua morada, alaga toda a casa, acha pouco  e quer transbordar. Tanto amor assim não é imprudência, não me enche de exigências. Quer, somente e tanto, que não o deixe desperdiçar. Explique-me como faz para tão grande amor permanecer, relato do meu e em você, e você "visse" e versa. Explique-me o segredo de amar tanto e assim, com tamanha intensidade uma ideia bonita que se deixa habitar. Explique-me e admita, admita que a resposta complica e não é fácil de agradar. 
Bendito seja o amor que existe, faz poesia em verso triste e vê beleza em cada luar. Explique-me toda essa loucura: amor nenhum é cura, mas é fácil de matar. Mata-me cem vezes e em todas as cem hei de amar!
Bendito seja o amor que cria asas e permanece, sabe voar em céu terreno, nega todo o inferno horrendo que o faça acabar. Tal amor está firme e forte, sólido e resistente, mas você aparece... começa então o desabrochar. Veja só que amor displicente, totalmente desobediente, acabou de derreter. E, mesmo derretido, permanece e só evapora ao amanhecer. 
"Onde está o meu amor? Erá sólido e líquido virou, virou gás e flutuou. Desistiu tão fácil assim?"
Então o amor troveja, grita um raio ao pé da ladeira e gotas de chuva começam a cair. 
Bendito seja o amor que inunda!
Bendito seja quem o deixa entrar e transbordar!
Amor, você voltou...! Tão bendito, meu amor... 
Há muito espero chover para poder dançar, por todos os lados vem chuva.
Vem, amor! Inunda... Faz da minha casa o seu lar e de mim o seu lugar. 
Bendito seja, amor!

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Passeio sem pontos

Tudo que passa pequenininho
Passa lento e devagarzinho
Não espera ser o que não há de.

Tudo aquilo que passa
Passa e um dia vem
Retorna em forma de brasa
E está longe de assumir o desdém

Cria-se laço
Afoga-se por acaso
Ressuscita e é só

Vem em forma de brasa
Tudo aquilo que passa
Mas que um dia permaneceu

Não é gira-gira
É vai e vem que lembra e retorna
Cansa e recua

Tudo que é pequenininho
Passa em desalinho
Ao acaso
Por mero des-agrado

Tudo que é
É verbo inconstante
Estar e não estar
O português não abrange
Há muito o que saber

E tudo que é pequeno
Passa
Leve e com graça
Suaviza nos acordes da manhã

Tudo que é pequeno
É calmante
Simples e aconchegante
Todavia
Hoje é estar e amanhã não estará

Tudo que é pequeno, é grande
Fica além do real
´
É pequeno, somente pela inconstância do estar

Tudo que é pequeno
Passa
Primeiro, ao meus olhos
Sem nenhuma graça
Em segundos, eu que passo
e re-conheço

Me viro pelo avesso e mudo o canal para ser estar

Tudo que é pequeno
Torna-se grande
Aos olhos, almas gigantes
E o coração, em um leve acelerar...




sábado, 4 de julho de 2015

todo ponto é um barulho

Esse barulho é inconsequente, confesso que não me é diferente daqueles tantos silêncios que já ouvi. Espere ao menos que consiga desembaralhar as palavras, colocá-las na ordem correta,  pegar o dicionário  e tentar decifrar esses inúmeros acontecimentos que estão amontoados por aqui, aqueles que ainda estão por vir ou simplesmente se deixam levar... O barulho é barulhento, não me é prazeroso e pouco tenta agradar. Na verdade nem agrada, quer mais é atenção, barulho mais sem noção... por aqui não quero que se deixe habitar. Ainda que dê uma pausa com esse barulho todo, o silêncio que se faz não me é convincente, muito menos conveniente, só mais um barulho a “barulhar”. Você acha que só se faz barulho aos gritos, juro que não acredito... Como se deixa enganar? Espere ao menos eu pegar o dicionário, procurar por um sinônimo no real vocabulário, encontrar alguma explicação. Toda essa conversa não é crise de coração ou uma rima a mais com a palavra anterior. Você nunca entenderia, jamais conseguiria compreender o que nunca se explicou. Não se explica o que não se sabe, o que está confuso e é indiferente, não é bicho, nem é gente, é sentimento e deve estar carente. O dicionário vem surpreendentemente e diz que de algo necessita, mas não me venha com coisas restritas, o mundo é mais do que isso aqui. As coisas estão amontoadas e todos gritam, o silêncio que se faz é ensurdecedor. Dê um stop, uma pausa breve, um momento pra descansar. Espere eu pegar o dicionário, me dê mais um que horário, não me deixarei levar. Existe coisa nesse silêncio todo, grita menos um pouco, mas ainda assim dá para ouvir. Espere que eu entenda o que acontece, se faz necessário algumas preces e confesso: dicionário algum traduz isso aqui.