terça-feira, 29 de novembro de 2016

Relações insuficientes: o jovem no mundo que não permite a estagnação


A insuficiência das relações corrobora com a constante social que nos é apresentada desde o berço. O mundo não permite a estagnação. Não basta terminar o ensino médio, não basta a graduação, mestrado, doutorado, pós... Falar somente o inglês já não significa muita coisa, o currículo precisa ser extremamente bom, o emprego precisa ser “decente”, a família deve ser “modelo” e a inteligência absurda. A vida nos é apresentada com manual de instruções e não nos basta seguir o roteiro, é preciso surpreender.
As relações são frustrantes e altamente críticas. O sexo do bebê torna-se motivo de desgosto para alguns e sua decepção não é aliviada após o nascimento – a criança, se não acompanhada devidamente, nasce e cresce com o pensamento de insuficiência por não considerar-se boa o bastante para sua própria família. Além da carga emocional, a estética passou a ser sinônimo de felicidade fajuta: dietas desequilibradas, cirurgias arriscadas, saúde comprometida; tudo para seguir os padrões, agradar os outros. Mas quem agrada a nós mesmos?
A criticidade não permite não o erro. O suicídio entre jovens brasileiros tem crescido nos últimos tempos, o índice é preocupante e aponta para o seguinte fato: o jovem, ainda que na sua fase de amadurecimento, é símbolo de ascendência social e futuro. Para um mundo altamente globalizado e extremamente capitalista, não é permitido a estagnação. Os jovens precisam ser bons – eis o risco.
Toda essa pressão psicológica, é descarregada de forma brutal e eles se veem acuados. Precisam ter boas notas, falar no mínimo três línguas, ter um emprego maravilhoso e um currículo gigante. Não o bastante, sofrem com a imposição das redes sociais, o espetáculo de padrões, transtornos quanto à sua sexualidade e gênero e a não aceitação social.
Assim, torna-se evidente o problema e a sua urgência para com uma solução. É necessário que os pais, a escola e a sociedade atente-se ao fato e busque melhorias em suas ações. O diálogo, a compreensão, o apoio, são soluções bases, mas fundamentais, que possibilitam ao jovem um amadurecimento na tomada de suas decisões, além de preparação para as dificuldades que podem ser enfrentadas. No mundo onde tudo é urgente, rápido e crítico; é preciso de calma para interagir e paciência para compreender. O jovem não deve e nem precisaria buscar a fuga no suicídio se lhe fosse permitido respirar e começar novamente do zero aquilo que antes não deu certo, sem críticas ou pressões em demasia.

segunda-feira, 28 de março de 2016

Canta, mas ninguém escuta

O som que canta lá fora não é o mesmo que canta aqui.
De que maneira a intensidade com que se sente – e sente profundamente
Pode tornar-se menor?
O rio que corre na veia, de sangue é
E é e se retorce
E comprime
E deságua
E inunda, alagando o mesmo rio que não deixa de existir
A chuva que cai não é água
E o som que canta lá fora não é o mesmo que canta aqui
Menor, menorzinho, menor, menorzinho
De que maneira a intensidade com que se sente – e sente profundamente
Pode tornar-se menor?
Menor, menorzinho
O rio que corre na veia, sangue, incendeia
Evapora
A chuva que cai não é água
O vento que dança, de ar não é feito
O frio balança o corpo
E o rio, que corre na veia, congela
Frio
O som que canta lá fora não é o mesmo que canta aqui
O som que canta lá fora não é o mesmo
O som que canta lá fora não é o mesmo
E já não canta aqui


terça-feira, 15 de março de 2016

Cubo mágico, cubículo

Aqui, onde a noite é insônia e o dia ameaça chegar, o vento sopra, o cobertor aquece, a luz apaga. O cubículo torna-se menor. Aqui, onde queima a esperança e o leve ardor da chama que insiste não finalizar, eterna. Desse lado, o de cá, que os dias são dias e dias e dias e dias. Sem fim. Desse lado, o de lá, que as noites são noites, por fim. Aqui, onde tudo acontece. Absorve, dissolve e, cautelosamente, se esvai. E vem, e volta, afinal. Aqui, onde mora um morador. Feito de algo que não sabe o que, que sabe e sabe e sabe. Aqui, onde tudo acontece. E conhece, desconhece, desconhece. Que é o que está. Aqui... dentro, fora. Bordando o acolá. Lá... do lado de onde tudo é menor. Cubículo. Cheio, cheio, cheio
Vazio.

Meu nome é mau humor

São onze azulejos na horizontal e seis na vertical. Meu dia é sonho e minha noite insônia. Meu mundo parece vago, meu desespero é horário, meu crime é falta de tempo. Minha parede é rabiscada, meu retrato é esquisito, meu tempo é perigo, minha vida é alma. Minha dança é agitada, meu coração é pulsante, meu inglês is not good, meu nome é mau humor. O guarda roupa tem seis portas. Não tem sentido e nem espaço. Meu teto é claro, meu chão é piso. Meu céu é divino, meu papo não é reto. Estou ficando zen,  só cultivando a paz interior (mas não me atormente não, faça o favor).  Meu dia é curto, minha noite é longa, meu coração está em seu devido lugar e minha paciência é com limites. São onze azulejos na horizontal, onze!!!! Eu contei e não achei sentido.

domingo, 7 de fevereiro de 2016

Morrer, todo mundo morre, nascer de novo é o que importa (!)

Nasci morrendo. 
E vivo nessa de nascer e morrer todos os dias. 
Meu tempo é fogo
E a morte é vento
Ou água
Ou qualquer coisa que independente da resistência do fogo meu, o dissolve.
Todos os dias a mesma história: 
nasço e morro.
Morro e, por pouco, não morro mesmo
E depois de morrer, tem isso:
Isso de viver.
Eu nunca entendi bem a vida. Meu desejo de compreendê-la é companhia ao outro desejo meu de não desejar nada, de não saber nada e deixá-la seguir. A verdade é que temos medo da morte. E não me refiro à existência. 
Nasci morrendo, perdendo segundos antes mesmo de conseguir respirar pela primeira vez.
Nasci. E nasço novamente todos os dias. 
Meu medo vem de dentro e só de dentro eu consigo superá-lo. 
Meu inimigo sou eu mesmo.
Minha morte é não viver. 
Minha eternidade é composta de agoras.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

O referido é verdade e dou fé

Gritaria se me fosse possível.
E é. Fiquem vocês sabendo.
Não grito, porque não quero. 
Ninguém pôs-me uma mordaça.
Decerto, colocaram-me à roda das extravagâncias.
Ativaram os insultos.
Gastaram-me elogios.
Antes os tivesse poupado...
Se não do desprazer de nada adiantar, mas da paciência
(por vezes fugitiva)
e para a qual obtive êxito.
Ilustríssimos roedores:
Não queiram por meio destas linhas, roubar o queijo que não lhes pertence. Os senhores bem sabem da dificuldade que é de agradar os paladares refinados. Isto não quer dizer que seja grande coisa, mas pouca não há de ser. Fiquemos esclarecidos que o paladar pouco importa e serve, senão, para dar vida à gostos e mal gostos que podem poupar-me os ouvidos, as rugas, as linhas de expressão e os cabelos brancos, bem como as rabugices que saem do buraco negro que é a boca quanto à vida e o que fez-se dela. Contariam os mais velhos, a história nostálgica. Os observadores pintariam o quadro:
Eis que no centro está o réu.
E aos arredores, os extravagantes.
- Por que não?
- Creio que não seja. E se não é, Excelência, me recuso a ser.
- Declaro o réu digno de sua vontade. Sendo esta, sua própria liberdade e o desprezo ao quadrado que o cercaria se, por ventura, a rejeitasse. O Sol não nasce quadrado, assim como o amor não pode tornar-se um cárcere. 
Está dada a sentença.